Desenvolver a marca Portugal foi apontado como objetivo pelo Governo. “Uma marca necessita de tempo para ser construída e os ciclos políticos são por definição curtos”, alerta o COO do WYgroup.
Pode parecer um paradoxo, mas é uma realidade. A construção da marca Portugal precisa de marcas, comenta João Santos, COO do WYgroup, em declarações ao +M. “Um programa de construção de uma marca forte de país, necessita de marcas fortes setoriais. E não as vai conseguir apoiar todas, mas antes aquelas que joguem este jogo das sinergias entre as marcas. Se queremos ser um país tecnológico temos de apoiar a construção e desenvolvimento de marcas tecnológicas, se queremos ser um país de setores de grande valor acrescentado, é para lá que tem de ir o nosso investimento. As marcas internacionais são fundamentais para que o valor que elas criam fique e se consolide no nosso país”, acredita o responsável.
E prossegue. “Se a marca Portugal for um incentivo à exportação sem marca, estaremos todos a perder tempo e recursos, pois continuaremos a ajudar a desenvolver um tecido económico baseado em baixos salários e sobretudo de mão de obra intensiva”. A necessidade de apostar na construção de marcas tem vindo a ser defendida pelo responsável do grupo, inclusive no +M.
“Muito daquilo que fazemos com qualidade e mestria é vendido sem marca ou com a marca de terceiros. Muitas das nossas indústrias produzem para marcas internacionais, mas somos incapazes de produzir com a nossa marca e de a afirmar. Uma e outra andam de mãos dadas”, reforça, lembrando que a marca de origem ajuda a marca de produto e a marca de produto ajuda a confirmar a marca origem. “Veja-se o que pensamos quando olhamos para a marca Alemanha e o que nos ajuda a confirmar quando pensamos em Bosch, Siemens, Porsche, Mercedes, BMW, Audi, entre muitas outras”, aponta como exemplo.
A opinião do profissional vem a propósito de uma das medida apresentadas em julho, data na qual o Governo deu a conhecer o pacote de “60 Medidas para Acelerar a Economia”. O objetivo número 36 é claro: “Afirmar a marca Portugal no contexto global”. Para o fazer, pode ler-se na descrição da medida, a ideia será a “elaboração de um plano de ação para o desenvolvimento do conceito “Marca Portugal” de forma transversal a todos os setores económicos do país, de maneira a afirmar os seus produtos e serviços com maior valor acrescentado nas cadeias globais”. O plano, prossegue o Executivo, “será assente em dimensões como o conhecimento, inovação, segurança, criatividade, qualidade e sustentabilidade”.
Ora, se o objetivo parece claro, a execução é mais complexa. Cerca de dois meses e meio após o anúncio – feito em pleno início de verão, é certo -, o ‘caderno de encargos’ ainda não foi divulgado, mas o tema continua a ser afirmado como uma prioridade. “O Ministério da Economia está empenhado e comprometido com o desenvolvimento de uma proposta de valor robusta para fortalecer a marca Portugal num cenário global”, responde o ministério liderado por Pedro Reis ao +M, quando questionado sobre a evolução da medida. “Estamos a trabalhar internamente, baseados nas melhores práticas implementadas em diversos setores exportadores, e lado a lado com alguns dos nossos organismos, em particular com a AICEP, na abordagem deste tema”, conclui o ministério.
Em declarações ao +M, João Santos lembra que a iniciativa para criar e desenvolver a “Marca Portugal” não é nova, mas é de extrema importância. “Como sou uma pessoa positiva, vejo nesta singela medida uma iniciativa estratégica muito relevante e oportuna, e tenho pena que esta não seja a única medida deste plano mais extenso onde todas as outras se deveriam inspirar e depender”, aponta. Sem mais dados sobre o objetivo do Governo, João Santos refere que Portugal necessita de um plano que ajude transversalmente na sua diferenciação e competitividade, que valorize os seus setores estratégicos, que atraia mais e melhor investimento estrangeiro e que ajude a fortalecer a identidade e a coesão nacional. “Se as poucas linhas que descrevem o plano forem ao encontro destes objetivos, julgo que é de apoiar e de ajudar a concretizar“.
Quanto à concretização, “o Diabo está sempre nos detalhes”, como se costuma dizer. “Um plano desta magnitude e com a ambição certa, não poder ser construído para durar uma legislatura. Nem uma década”, alerta o gestor e especialista em marketing e comunicação.
“Se queremos ser sérios na sua implementação e queremos fazer algo que ultrapassa a medida de Relações Públicas para aparecer nas rubricas económicas das TV’s, rádios e imprensa, o plano deve ser coordenado e ajustado com as diversas forças políticas para que não seja posto em causa na próxima rotação de poder. Uma marca necessita de tempo para ser construída e os ciclos políticos são por definição curtos para estes objetivos”, avisa o COO do grupo de comunicação criado por Pedro Janela. “Qual o nosso modelo de país, a que setores queremos dedicar atenção, quais são aqueles onde o nosso desenvolvimento tem de assentar e de que forma os podemos alavancar, como podemos envolver os diferentes parceiros e partes interessadas, como nos vamos diferenciar”, questiona, salientando que é necessário que estas questões sejam respondidas para que esse plano possa ser mais do que uma intenção.
Quanto à forma como avalia hoje a marca Portugal, João Santos reconhece que, muito graças ao Turismo de Portugal, o país tem hoje uma imagem internacional muito diferente para melhor daquela que tinha há umas décadas. “O mundo descobriu Portugal, mas nós ainda não aprendemos como podemos aproveitar estes visitantes para lhes explicar um pouco melhor o que somos e o que fazemos. A marca Portugal tem de começar por aqui, por aqueles que estão disponíveis para nos conhecer desde já”, resume.
Artigo originalmente publicado no ECO