Nos últimos dias assisti a uma pequena conferência sobre Inovação. A um determinado ponto, o orador explica que determinados modelos de Inovação disruptiva têm de ser postos à disposição do consumidor a custo zero – oferecidos. Só assim se conseguem criar massa crítica para a sua adoção que permita a criação de efeitos de rede. Foi assim com quase tudo, desde a rádio à televisão, do Google ao YouTube, e por aí em diante.
De facto, nenhum de nós paga para fazer pesquisas, ou para ver vídeos. Trocamos o nosso tempo e os nossos dados por aquilo que andamos à procura, seja informação, conhecimento ou apenas por diversão. Para que este modelo seja possível, as empresas têm de ter um modelo de financiamento do seu negócio. E a moeda de troca é inevitavelmente a publicidade. A publicidade, essa incompreendida, paga o nosso entretenimento, uma parte do nosso conhecimento, e é uma facilitadora da nossa vida. Mas não gostamos dela.
E é fácil entender porquê. Na maioria dos casos ela é intrusiva, coloca-se no meio do nosso caminho, obriga-nos a olhar para ela, interrompe-nos! E para mim este é o ponto fundamental. A publicidade interrompe o nosso momento, para-nos o raciocínio, corta a narrativa. Enfim, incomoda!
Com a ambição e a ânsia de conquistar a nossa atenção, a publicidade criou, ao longo do tempo, a fama perversa de ser intrusiva e indesejável. De significar uma indesejada paragem. Paragem essa que os consumidores, todos nós, se vingam ao utilizarem para fazerem, também eles, outras coisas. É uma espécie de “amor com amor se paga”. Quem nunca mudou de canal de TV quando o break publicitário arranca, quem nunca contou os longos cinco segundos do vídeo para fazer skip, quem nunca procurou o botão de “ir para o site”, pois já não suporta a imagem que o antecede?
Então se todos fazemos isto, e temos a noção de que o modelo que vem dos anos 50 do século passado já não funciona, porque não procuramos outro? Por que razão continuamos a fazer com que as marcas se tornem intrusivas e indesejáveis. Porque insistimos a interromper a vida dos nossos consumidores, quando nós mesmos ficamos irritados quando alguém nos interrompe quando estamos concentrados a fazer algo?
Um executivo muito sénior da indústria da media publicitária disse-me um dia que ninguém estava preparado para mudar. E que ninguém quereria mudar.
No entanto, também aqui a mudança é uma necessidade absoluta e urgente. Os blocos publicitários, tal como estão construídos hoje, não ajudam as marcas. Não acrescentam valor. Em TV é normal encontrarmos frequentemente breaks de 15 minutos. Esta duração retira pessoas do ecrã, e isso penaliza as marcas e os seus objetivos. A criatividade joga aqui um papel fundamental, mas tem de contar com a disponibilidade de todos os intervenientes, pois a criação de um ecossistema comunicacional menos intrusivo requer mudanças estruturais em todos os intervenientes da cadeia. Mesmo o modelo atual de desenvolvimento publicitário estará posto em causa, e a mudança deverá acontecer para um novo modelo de conteúdo patrocinado onde a marca terá o seu palco desde que devidamente enquadrada num novo modelo de entretenimento.
Depois o próprio modelo económico da publicidade terá de sofrer ajustes. Até aqui as marcas produziam os seus ativos e pagavam aos suportes para os veicular. O modelo terá de ser mais de repartição. As marcas irão ter de contar que uma parte do seu investimento vai ter de regressar aos seus potenciais cliente, seja em formatos de gamificação ou de fidelização que atraiam alguns destes públicos para os suportes onde a nossa publicidade vai estar. Este poderá ser um modelo colaborativo entre anunciantes e plataformas, e quem primeiro o implementar terá uma enorme vantagem competitiva.
Tendo em conta os muitos milhares de milhões de euros que esta indústria significa à escala global, a alteração do paradigma parece-me absolutamente fundamental. Num mundo em que as marcas sofrem de erosão constante, uma das causas principais é a forma como comunicam com o seu consumidor. O modelo é antiquado e está desajustado. A sustentabilidade também tem de contaminar a publicidade, evitando o desperdício e, sobretudo, ajudando as marcas a serem mais eficientes.
Por favor, não incomodemos. O consumidor, agradece!
Artigo publicado originalmente no Mais M.