Now you choose restaurant

Agora escolha…

João Santos - COO at WYgroup
João Santos

Uma caricatura da vida das agências de publicidade, grandes ou pequenas, envolvidas no doloroso jogo dos pitches.

Ontem fui a um restaurante. Quando me colocaram o menu à frente disse que não ia pedir nada em concreto. Expliquei que era um cliente com apetite moderado, que tinha uma família constituída por quatro pessoas, que gostávamos tanto de carne como de peixe, mas que tínhamos uma filha vegetariana.

Disse ainda ao empregado que tinha dúvidas sobre o que escolher para a minha próxima refeição em família e que queria que ele me servisse três pratos que eu não iria pagar. E que ia repetir a mesma coisa nos dois restaurantes do lado nos dias seguintes. Aquele que eu achasse que era o melhor seria a minha escolha para a nossa refeição do próximo fim de semana. Fui insultado, mesmo depois de ter dito que ele é que ia poder escolher o que eu e a minha família íamos comer…

Para meu espanto a história repetiu-se nos restaurantes seguintes.

Na minha última tentativa ainda tentei explicar ao dono irritado do restaurante que era assim que a minha empresa trabalhava. Que recebíamos um pedido, muitas vezes vago e pouco concreto, que gastávamos muitas centenas de horas de trabalho de uma vasta equipa nele, que comprávamos imagens, que pagávamos locuções ou “cravávamos” favores, tudo para entregar uma proposta a um cliente que nos diria semanas ou até meses mais tarde qual seria a sua escolha. Ou seja, o meu “restaurante” parava de servir os seus clientes habituais para apostar tudo num novo cliente que não conhecíamos bem, mas que imaginávamos que ia ser tremendo.

O Sr. Alfredo – o dono do último restaurante – disse-me que tudo isto era um absurdo e que eu seria muito ingénuo, no mínimo!

Mas esta caricatura, pois é disso que se trata, é a vida de uma agência de publicidade. Grande ou pequena, pois são raras e honrosas as exceções de quem não entra neste jogo doloroso dos pitches.

Fui cliente durante muitos anos e sei bem as dúvidas e as incertezas que estão nesse lado. Reconheço-me em cada pedido e em cada desafio, e por isso mesmo não os critico nem diabolizo. Pelo contrário, entendo-os muito bem.

Mas então como tornar mais justa esta relação? De que forma podemos uns e outros encontrar um posição comum e uniforme? Porque é que duas ou três empresas têm de perder dinheiro para que outra encontre o seu parceiro ideal?

Há umas semanas, uma das agências do meu grupo foi chamada para apresentar uma proposta a uma grande marca internacional. Naturalmente, que o entusiasmo foi imediato e reuniu-se a equipa necessária para este grande momento. Não há muitas oportunidades assim, pelo que a ocasião traz responsabilidade, pois iríamos estar em confronto com duas outras agências do Centro da Europa. Aceitámos o desafio.

Alguns dias mais tarde recebemos uma comunicação da empresa a pedir-nos para a apresentação ser presencial na sede da empresa, e que para tal nos iria enviar o valor para o pitch. Como?? Alguém estava disposto a pagar-nos as viagens para ver as nossas ideias?? Beliscámo-nos para termos a certeza de que era realidade.

Na verdade, este deveria ser o processo pois é aqui que está a sua justiça. Independentemente de ganhar ou de perder, as ideias são a única coisa pela qual uma agência de publicidade é remunerada. Se as der, onde fica o seu rendimento? E quem as recebe o que faz com elas? Mais, na maioria dos casos não se trata apenas de oferecer as ideias, mas antes de gastar alguns milhares de euros em pessoas e materiais para entregar uma proposta.

O facto da empresa cliente pagar por essas ideias, torna-as suas. E quantas vezes nos aparecem ideias interessantes e até complementares de agências diferentes que depois não podemos usar porque uma delas não foi a da escolhida. A remuneração resolve isso. Mas também resolve outra coisa. Melhor, impõe outra coisa: a racionalidade no número de parceiros escolhidos. Noutro dia, uma das nossas empresas foi convidada para um pitch com mais sete outras empresas. Naturalmente, agradecemos e declinámos.

Encontrar um equilíbrio justo nos pitches publicitários é mais do apenas uma questão de boas práticas. É uma maneira de construir relacionamentos fortes e prósperos, onde todas as partes se sintam valorizadas e respeitadas. A equidade e a transparência do processo de pitch, o seu justo equilíbrio e a forma como é conduzido, leva a uma colaboração mais harmoniosa, a um maior respeito entre os intervenientes, e tem como corolário clientes mais satisfeitos e a agências mais bem-sucedidas. Ao reconhecer a necessidade de equilibrar as necessidades e expectativas de ambos os lados, estaremos no caminho certo para um futuro mais colaborativo e positivo. Basta seguir os bons exemplos!

Artigo publicado originalmente no MaisM.